domingo, 9 de agosto de 2015

CARTA SOBRE AMIZADE

            A quem endereçaria uma linha que principia no se dizer do muito a que temos por uma questão humana? Uma carta bastaria? A amizade é algo pra se guardar dentro do peito, como diria a canção... Não é troca de experiências, não é motivo de falso orgulho, pois se um homem descreve algo da realidade de sua vida, seria razão para contatos mais concretos. Não há que se dizer que a enfermidade possui linha reta. Para mim, basta ser amigo de Krsna. Apenas isso me basta, de tudo o que já enfrentei, basta como refúgio iridescente de meu espírito. Começo algo prolixamente, mas desfio um rosário de minha própria simplicidade enquanto homem. Não desejo mulheres nem vinho, não desejo maiores prazeres que não seja servir com humildade os desígnios a mim impostos pela natureza divina ao Senhor Supremo. Não que para isso tenha que convencer alguém, mas só encontro a paz dentro de meu Paramatma em consciência. Falaria longas horas a alguém que quisesse estar igualmente mais desperto, mas sei que por vezes o deserto é imenso para um punhado de areia, ou de sementes, quando possuímos a sorte de tê-las em nossas mãos.
            Conheci vários devotos em minha senda espiritual, e chego a um ponto em que não especulo mais a respeito de uma natureza material que só encontra seus reflexos nas lutas que se processam para obtenção de poderes, suas manutenções, seus hipócritas jogos, seus interesses, e me parece que – antes de comprovar nos diálogos inevitáveis – todos estão torcendo para perder ou ganhar nesse campo, ou lucrar, ou apegar-se gigantescamente aos sentidos, numa busca em que não me encontro e nem quero, não tenho ganas disso tudo... Lembro-me de pessoas que combateram a hipocrisia, que não possuíam preconceitos de nenhuma ordem, lembro-me de pessoas que estão presentes em lutas verdadeiras e, à simples lembrança desses heróis, faço-me crer que – mesmo tendo limitações em minhas liberdades – sou um homem feliz e realizado como poucos, pois aprendi a contemplar muito antes disso virar moda. Não sento na posição de lótus e olho para o Tao, mas compreendo que a física se aproxima do oriente, e que a Índia é um país muito mais importante do que os EUA, pois enquanto um é o berço da espiritualidade no planeta, o outro é campeão em guerras, violências e mortandades, além de ser a nação que incentiva cada vez mais a morte de animais para experiência e fast foods industriais. Prabhupada tentou levar a consciência de Deus a partir dessa nação, mas talvez não esperasse que o berço do imperialismo contemporâneo visse a si mesmo no trágico desfecho que agora se processa, juntamente com a crise global da União Europeia e todos os seus aliados, que permitem o apartheid que se sabe há muito em território de toda a Palestina ocupada.
            Portanto, creio que o momento é de profunda reflexão, e não poderia jamais dizer algo a alguns amigos queridos que não fosse real da minha relação com a própria vida, pois – que se saiba – apenas desta que a própria surge. Relato que surjo com a minha vida a cada instante que me caiba, e que continuo apaixonado por tudo que seja da bondade, pois ainda acredito que é nessa plataforma que conhecemos mais profundamente o que quer que seja, posto filosofica, religiosa ou existencialmente... Sigo em Bhakti, não sou um devoto exemplar pois ainda como carne, mas espero que a humanidade alcance sua razão de melhorar humanisticamente as angústias que assolam o coração dos aflitos, e para isso, creiam-me, o mundo tem que socializar um pouco a sua visão como um todo, se não, é impossível ser feliz. O processo de se conhecer alguém não se dá através de encontros fortuitos, justamente quando esse alguém possui mais vivência do que a pecha imposta de que esta pessoa seja enferma, já que a luz nem sempre é confortável...

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