domingo, 28 de abril de 2019

O ASCETA



         Buscar algo a mais em nossas vidas é fruto de maturidade existencial. Seja essa busca no plano material ou no domínio anímico, espiritual. Há uma realidade concreta que supõe a literatura religiosa que ao menos tenhamos materialmente uns óculos para ler um livro sagrado, e isso faz parte de um sólido e materialmente presente objeto. Então, se passa que, como em uma palheta de pintura, tanto as realidades de ambos os casos se fundem ou, como se diz no Gita, há modos de existência material, como a bondade, a paixão e a ignorância. Posto que a tendência da humanidade seja a aproximação com o que se crê prosperidade material como uma relação com o divino, essa é uma questão algo turva do propósito mais verdadeiro e religioso, por conseguinte. O ascetismo religioso pode ser necessário em alguns aspectos, principalmente entre a devoção continuada, mesmo que se tenha nas mãos o segredo de que a Vida Simples e Pensamento Elevado continua a ser um grande livro da ISKCON – International Society for Krishna Consciousness. Para um neófito, um livro sobre como pararmos com os abatedouros através de uma conduta religiosa, comendo os alimentos primeiramente oferecidos a Deus: comendo os restos de uma prasada, fruto desse oferecimento. Mas, voltando ao ascetismo, o importante é saber que o Serviço Devocional Imaculado ao Senhor Krsna revela que podemos trabalhar em uma fábrica, escrever textos de filosofia, sermos administradores de algo, mentores ou mestres de uma escola, diretores de empresas, operários da construção civil, em síntese, dedicarmos nossa vida em trabalho dentro ao menos da posição da bondade dos modos materiais. Essa é uma diferença crucial, posto o modo da ignorância, por exemplo, traz na face da sociedade sempre a turvação da compreensão mais verdadeira, a razão que nos compele a prosseguir em nossa missão no mundo. Não será através de repetidos nascimentos e mortes que estaremos mais felizes em nossa existência, mesmo sabendo que um devoto de Deus possa estar em um ambiente hostil e na verdade pregando a Palavra Dele, pois ao religioso verdadeiro só importa a Bhakti-Yoga, ou seja, o serviço imaculado ao Senhor, nascimento após nascimento, mesmo que para isso tenha que sofrer a tentativa ilusionista de Maya, que transcende por vezes a própria pergunta original: quem somos, de onde viemos e para onde vamos. Prestar o Serviço Devocional em Bhakti sempre será mais importante do que renunciar a tudo e viver em um lugar isolado, mesmo porque neste mundo atual o renunciante não encontraria a paz necessária para tal ordem. Um sanyasi – renunciante – pode dar de seu conhecimento dentro dos templos, e os mestres espirituais por vezes fazem esse voto. Mas hão de ter retaguarda material para que ao menos o corpo possa estar unido à alma, ao espírito, ou seja, sua vida depende de algum artifício material, pois, sendo esta a energia externa do Senhor nós, como energias marginais damos voz ao corpo e podemos transcender a identidade falsa de que somos este corpo, pois não passamos de almas espirituais com um corpo que vai mudando, desde uma tenra idade até a velhice.
         A não consecução da percepção da realidade que se apresenta de vários modos, leva a uma solução do único sacrifício para esta nossa Era do Ferro, ou seja, cantar os nomes do Senhor e associar-se com devotos. Uma grande mudança de paradigma ocorre com a consciência aflorada em Krsna, e sabermos dar valor ao nosso mundo para a frente da Era Dourada que Sri Caitanya nos legou, é saber da atitude espiritualmente revolucionária frente aos paradigmas da mecanização que o mundo digital e suas máquinas começam a impor-se como realidade crível e seus convencionamentos. Daí a ver-se que o ascetismo religioso pode comungar com esse encontro na verdade jamais compulsório com a tecnologia. Mas saber usá-la bem resulta em que tenhamos mais poderes em espalhar a Consciência de Krsna ao redor de um mundo inteiro: desde um coração de um asceta, desde o coração de um Yogi.

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