Nada
é muito parecido com a circunstância daqueles que sofrem males mentais. O
sofrimento não possui tradução verbal, não se caracteriza como dor física, mas
talvez com um embate em que muitos tentam manter-se – mesmo que silenciosamente
– sobrevivendo aos aspectos internos do sofrimento que lhes acomete, como ao
estigma que a sociedade impõe desde os que estejam mais vulneráveis ou
extremamente medicados àqueles que aparentemente estão mais despertos, com
razão mais sólida. A versão que passa na cabeça dos que estão normais nos seios
da sociedade é de que os enfermos dessa natureza são peças inúteis ou refugo
existencial, onde só os familiares arcam com os óbices que impedem de modo
previsível que haja um encaixe dessa gente no mercado, posto este já coloca as
barreiras contra a contratação dessa gente. A realidade em certas nações
enfrenta a si própria, espelhando o significado autofágico de si em gentes que
vivem à margem da normalidade citada acima. O que leva a tangenciar a discriminação
contra as enfermidades psíquicas, mesmo quando sabemos que a incidência destas
ocorre cada vez mais amiúde, tendo em vista o distanciamento do ser com relação
ao real; a ilusão passa a ser cada vez mais presente no cotidiano da vida neste
novo século, de profundas transformações tecnológicas. Procedem estudos cada
vez mais fragmentários em especializações e a profunda queda do humanismo como pilar fundamental necessário a que se reduza o conflito, não apenas ao ego
particular e coletivo, como à automatização do indivíduo em saberes que levam
apenas a um treinar excessivo como prática ou preparação a algo que em síntese
não existe concretamente, posto invenção sistêmica. Esse algo pertence a um status quo que muitos incorporaram como
um tipo de existência ou modo de vida que não necessariamente seja o mais
correto, mas a coisificação, ou uma sociedade de objetos está cada vez mais
presente, onde o real passa a estar do outro lado dos gadgets, na forma do encontro pontuado pela aceitabilidade ou o
antigo conceito de popularidade, sempre atual, pois sempre viveremos em
sociedade.
Em
questões da dissociação que dão origem a enfermidades de ordem psíquica,
certamente os tempos em que vivemos fazem do acúmulo de informação e da ordem
algo ilusória na mecanicidade do funcionamento de grupamentos sociais, esta que
pode incluso ser mensurada e igualmente “coisificada”, torna qualquer agente do
sistema apenas um ponto que se torna vulnerável enquanto ação parcial ou
filtrada por critérios de hierarquias sociais, ou mesmo colocações de mercado.
A questão da permuta em que se pretende a sociedade atual, seja de ordem
financeira, afetiva ou de aceitabilidade, dando jus a uma frieza sem medida
quando se torna um ser nada parecido mais com qualquer laivo de humanidade, mas
sim pronto ao ataque, deixando a atitude pacífica alicerçada sobre as questões
de segurança, que são na verdade necessárias mas não o suficiente para que
outros modos culturais nos aproxime do viver mais saudável e independente. Essa
medida criteriosa para que façamos de um lugar, um modo de nos portarmos, um
encontro espontâneo, e a experiência de nos tornarmos independentes dos objetos
eletrônicos, e uma vida com harmonia passa pela consciência de cada habitante
do planeta, e quem sabe a consciência de que ao menos que prossigamos em um
mundo onde já erramos o suficiente ao ponto de destruir o que deveríamos ter
preservado com prejuízos graves e agora inevitáveis, então que façamos desse
caminhar sobre nossos erros a comunhão que nos esquecemos de encontrar quando
ainda tínhamos chance para isso. Nunca será tarde para isso, mas o agora urge
pelo suficiente... Esse tempo do já seria apenas a compreensão dilatada para
aquilo que desconhecemos no próximo, e a luta que devemos empreender, com seres
sociais gregários, para desmitificar certos estigmas que podem nos levar a uma
sectária forma de nos portar, levando a um preconceito e permitindo mais e mais
o surgimento do totalitarismo, seja ele aberto ou silencioso nos seios de
nossas já tão enfermiças sociedades.
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