domingo, 11 de outubro de 2015

A ARTE NÃO MORRE

            A arte reside onde menos esperamos, nas filigranas das culturas, nos acervos – mesmo digitais –, na contraposição e resistência em relação às imposições de conceitos dito contemporâneos, no líquido do óleo e terebintina e em antigos suportes que não sejam estes midiáticos que a querem derrubar. Um rabisco é um pensamento expresso, uma linha de vernáculo pode ser um discurso atemporal, um gesto de uma caneta bic pode colocar em xeque, através da compreensão da lógica, a arquitetura de um sistema, pois o conhecimento das artes e entre elas a própria arquitetura pode contestar mitos e fazermos quebrar imposições por vezes ocultas através da abertura de entendimento da própria arte como ferramenta de conhecimento...
            Os meios se suplantam, e foi no surgimento do computador que surgiu a democratização dos mesmos meios que criam a arte utilitária: o design, a arquitetura, a arte visual encerrada nas dimensões dos pixels, haja vista, sem a textura do pincel, sem o brilho das tintas, sem a vivacidade da exposição no suporte mais tradicional e inquebrantável, que ainda é e sempre será o papel, as telas, o quadro. A compreensão dos mesmos meios tradicionais de uma geração ainda atuante e que tenha necessariamente se aprofundado na arte mais tradicional, que tenha compreendido o modernismo, o surgimento do impressionismo como quebra da ilusão naturalista, mas que tenha igualmente percebido a necessidade da arte como expressão máxima do ser humano como aproximação vital da própria natureza e engenho humano, dita que saibamos orientar as novas gerações. Quem nasce sob a acepção da realidade virtual, quem tem apenas contato da relação visual com o mundo dito da arte através dos computadores e seus derivados, vai limitar-se a ser cada vez mais confundido pelos meios facilmente mais manipuladores do mesmo sistema global que tentam compreender. O fenômeno da imagética torna sensível o ponto nevrálgico em que a ilusão de uma tecnologia sem precedentes faça os seres humanos crerem que a ciência pode criar um ser, ou que o próprio computador pensa como um ser, no que dista a realidade dessa circunstância, corroborado pelo fato vital que um computador pensa menos que uma barata, enquanto ser que inexiste, pois não possui alma, diferentemente do inseto. Com base nessa lógica é que devemos compreender a tecnologia e que as suas informações e captações não passam de um sintetismo de fluxos que adquirem a própria frieza da areia de sílica, matéria bruta da qual surgiu.
            Quem quer ver que se leia corretamente, e saberá nas entrelinhas da natureza que estar mais sintonizado com esta seja uma lei derradeira da compreensão do que é a ferramenta osso do filme 2001, Uma Odisseia no Espaço, e a espaçonave em seu salto. Resta saber que precisamos compreender o osso para depois tomarmos ciência de quem sabe construir uma espaçonave, e que a água que procuramos em outros planetas pode ser a revitalização da arte na Terra para que possamos revitalizar as nossas culturas, em uma contradição necessária a que paremos para pensar o que temos concretamente até então. Seremos sempre carne enquanto carne, e pó depois dela. Nossas vestimentas... Deixamos um legado que deva ser escrito por nossas mãos, e a literatura se mantém de pé e flexível como um gigantesco maço de bambus... Por falar nisso, na arquitetura do bambu, seus encaixes, seus copos, suas estruturas, existe mais conhecimento do que em muitos troncos computacionais de extremas complexidades, pois não devemos descartar que tudo o que é programado no ordenador passa pela organicidade do zero e um, do negativo, do positivo, e nada mais, com suas infinitas mas finitas combinações, pois para chegar a um aplicativo, por exemplo, estanca-se o ciclo produtivo. Voltando à arte da arquitetura, aliada a compreensão das letras, mostra-se o viés de nossas culturas que a arte subsiste tremendamente nas mesmas letras. Mas o uso indiscriminado das redes sociais remete a um subliminar fragmentário do pensamento em vibrações curtas de frequência e a exposição e aumento deliberado do falso ego. Um exemplo cabal é que, na verdade, a associação das letras: kkkkkkkkk, encerra um nada e ao mesmo tempo um feed back, ou, melhor dizendo no nosso idioma, uma resposta positiva. Será tão positiva assim? Ou não será, falando aos olhos do vidro que nos olha, apenas o recrudescimento da ilusão e uma perda de tempo, em que não programar o toque no cabelo de uma mulher ou de um homem seria quiçá mais vantajoso em termos de ternura sincera?
            Cabe a nós refletir sobre o tema, mas recorre, em termos gerais, que a arte e principalmente o retorno ao artesanato como base fundamental dos alicerces culturais e antropológicos de nossas culturas, são extremamente importantes, e sua existência, e compreensão, sua releitura consciente no fazer artístico, o exercício de lógicas outras que não sejam apenas a cartesiana, a compreensão da existência geométrica na Natureza para aprofundar a percepção do espaço e o sentido humanitário da divulgação solidária entre nações e culturas e o aprofundamento em se compartir conhecimento, seja de qualquer natureza e, finalmente, a criação e preservação de todos os nossos patrimônios, tornam-se condições a que passemos às gerações de nossos filhos a simples consciência de que podemos criar com um pedaço de tijolo um rabisco no muro, nem que seja de um quintal como o que temos em casa, ainda à disposição da expressão fundamental. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário