quinta-feira, 12 de outubro de 2017

TRANSIÇÕES DE RUMOS

          Mais um dia, mas era feriado no país. As posições da climatologia afirmavam que não haveria chuva, principalmente sem variar no interior gigantesco, com a seca que praticamente incendiava os matagais. Mas na cidade de Emília fazia bom tempo, e ela não queria estar muito a par de alguma tragédia humana ou natural. Conseguira uma promoção em um novo emprego, justo quando entrara, pois omitira o fato de conhecer inglês fluentemente, e de balcão rumara ao administrativo, quando finalmente conversara nesse idioma com um fornecedor estrangeiro. A pequena loja era, na verdade, um atacadista, e havia um galpão na rodovia federal que poderia armazenar estoques das roupas que comercializavam. Da loja, ela controlaria algum fluxo mais simples nas planilhas, mas haveria de fazer contatos comerciais principalmente com fornecedores chineses e suas jaquetas – principal mercadoria – com preços de acordo com a crise. A Cruiser era uma boa marca, e de micro empresa já se transformara em uma de médio porte, e na cidade que não era apenas uma boa capital de boa logística, já se confirmavam outras praças do mercado regional daquele Estado, onde as roupas e seus acessórios já firmavam contratos permanentes com a empresa Hen Shi, chinesa. O objetivo último de Claudinei seria ampliar até consolidar um bom mercado, e depois usar uma marca outra para tornar o comércio de acessórios mais flexibilizado, diversificando investimentos e padrões de consumo. Para Claudinei, a linha de frente eram as pessoas, e Emília com seu inglês fluente entrava como funcionária mais graduada na empresa, igualmente com seus conhecimentos de planilhas eletrônicas, seus fluxos e cálculos. Inicialmente, passaria a ganhar bem mais do que seus 1400,00 reais que obtivera em sua experiência no balcão de uma padaria, mas trabalhara tão bem que o dono da padaria lhe fizera uma contra proposta, mas o emprego na Cruiser era irrecusável. Bem, a sala onde trabalhava era pequena e os espaços possuíam a aura de aproveitamento total, essencialmente informatizada, e funcionalmente eficiente. Os objetos de escritório não faltavam: as pastas, um ficheiro de gavetas, uma rede bem segura, quatro computadores e dois telefones. Tudo dentro da ergonomia perfeita e com intervalos para os operadores, como no Japão, dez minutos em cada hora. Na parte de baixo desse escritório funcionava a loja e Claudinei a maior parte do tempo atendia a clientela pessoalmente, pois gostava de atender, e essa era a sua qualidade maior como comerciante. Gostava igualmente de conferências econômicas, mas não sabia outro idioma além do português natal e um pouco de espanhol, de tantos verões que aprendera, haja vista a capital – litorânea – receber tantos turistas latino americanos em sua maioria na temporada do verão.
           Os tempos daquele ano transcorriam aparentemente mais serenos no espelhamento da personalidade de Emília. Estava afeita com seu progresso, e vislumbrava tantas as possibilidades da solidez profissional, que nunca pensara no estudo como vantagem ou trunfo, visto para ela sempre ter sido uma necessidade. A lógica dos números e a natureza das palavras eram duas coisas que lhe davam imenso prazer, e recordava seu primeiro romance lido no original em inglês, uma história de suspense de Agatha Christie. E a sua aproximação diletante com as planilhas, especialmente a Excel, que seria uma mostra de como organizar seu planejamento financeiro doméstico, a supor, que funcionara como um aprendizado com aplicação prática. Apesar disso, o cálculo nunca fora muito o seu forte, quando no nível das derivadas e integrais, na faculdade que não terminara… Nas suas horas de folga, gostava de tirar fotos que revelavam sua sensibilidade, e seu amor à Natureza impulsionava essa modalidade de arte. Recentemente, dera para estudar programação e, já com meio século de existência, jamais parava de estudar, pois vira na prática que isso era uma coisa que muitos deveriam se espelhar, não necessariamente autodidatas como ela, mas igualmente na importância que tem a educação para o povo de qualquer nação, uma condição fundamental para a formação dos futuros profissionais ou artistas que partem a construir o arcabouço cultural da sociedade. Emília acentuava seus dotes de mulher independente, e agora estava mais realizada com a oportunidade esta que lhe aparecera. Seus rumos praticamente ampliavam, pois de sua experiência com o orçamento doméstico partiria para a consecução do controle de estoques e outros aspectos da administração de uma loja já estruturada, o que precisava apenas de mais insumos na inteligência operacional. Conforme saber-se do novo como pressuposto, da tecnologia que agrega, que se torna por vezes indispensável, mas que não é por si estanque, ou última palavra, haja vista uma nação investir em seus próprios potenciais criativos, para não cair na modorra de se tornar cada vez mais dependente de recursos duvidosos porquanto separados da realidade própria de cada nação que urge pela independência efetiva e progresso consolidado. Então, cada vez que Emília tinha uma ideia, cada vez em que mais e mais optara por softwares abertos, Claudinei a admirava e pensava: como então, uma mulher madura que mais parece uma eterna estudante e fomentadora de novidades, que boa funcionária tenho!
Emília passara a viver pensando em como otimizar a empresa. Entrava cedo e saía tarde, mesmo porque não possuía um computador ou todas as ferramentas que a Cruiser dispunha. Quem sabe dali a dois meses de economia pudesse comprar o necessário para se desenvolver, embora seu patrão lhe desse carta branca para desenvolver suas ideias e projetar sua eficiência. Promoveu-a, depois de três meses de trabalho a secretária e desenvolvedora, duas funções que até então revelavam a aceitação de uma inteligência multifocal à garantia de se obter vantagens. Como secretária organizava tudo que houvesse dentro de sua alçada, e como desenvolvedora trabalhava espelhando ideias realizáveis a curto e médio prazo não fora da sua função do secretariado. Aliás, o secretariado moderno, onde o diretor, através de sua própria atualização dial, sabe a que serve o funcionário. A transição se fazia na mesma modernidade em função do fator tempo reservado dinamicamente com as novidades e um outro funcionário pesquisava para manter Emília a par das novidades e possibilidades de inovação. A empresa renovava as perspectivas, e era inegável que Emília passava a exercer uma importante liderança. Uma verdadeira e genuína TI se formava, junto aos contatos presenciais com outros atores representantes de outras empresas ou grupos empresariais.
          Emília, com o crescimento exponencial da Cruiser, assumira finalmente a diretoria financeira e de recursos humanos, conciliando uma carreira de executiva praticamente meteórica. Investidores apoiaram, o crescimento foi compatível com o mercado e ela começou a viajar bastante a negócios. Tornou-se sua vida mais plena, posto ainda que antes estudando de somenos aparentemente, revelou que – finalmente – em seu diálogo consigo mesma é importante estudarmos se quisermos crescer, e pensou: imagine uma sociedade onde a escola pública seja um exemplo em democratizar conhecimentos com níveis de excelência: a nação sorriria mesmo com dificuldades.

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