terça-feira, 10 de outubro de 2017

O TRATO

           Emília gostava de saber sobre o que via, melhor, nas fronteiras da percepção… Não saíra por aqueles dias, pois Shakespeare se tornava uma literatura que a absorvia, em sua quase inanição frequente pelo saber, por sua fruição, por algo que a tornava distinta, pois nas praças de alimentação não via tanto o recorte de sua existência como um remendo a remendar e reconstruir no que via em uma biblioteca, em exemplo cabal de uma leitora. Por vezes se pensava – na mesma sociedade onde os livros não eram sucatas por serem parte dela – que a literatura, a filosofia, sequer mereciam atenção, mas a positividade dos laços que nos unem ao nicho existencial mais profundo requer a mesma leitura linear e concludente de quaisquer sonhos que tivermos pela cultura de toda a população. Esse trato com o modo de existência, esse requisito formal pela opção de se pensar mais abertamente sobre tudo fazia de Emília uma mulher mais plena, mas completa, mais feliz.
          Havia algo, no entanto, que ela supunha quiçá mais verdadeiro, que era a leitura outra de como o mundo era, em sua acepção e estrutura pessoal. Não haveria como separar, na sua opinião e contemplação por seus ávidos e serenos olhos, a tecnologia como meio e a imagem como linguagem. Nem tudo seria a imagem digitalizada, e requereria um esforço raro para alguns saber distinguir a fruição estética e funcional da Natureza e seus motores, pois quando a planta cresce em sua haste vertical de vida, o pássaro pode cantar celebrando mais um broto da mesma planta. E quem dera fosse assim, mas não seria a Verdade, posto já saber a nossa personagem que certas apreensões da realidade são muito pessoais. Seria um trato ao viés, mas na verdade não era certo que pensasse com o método pretendido, já que na filosofia vem ao rebatimento das ideias um farto diálogo que se supõe tão amplo quanto estruturas não necessariamente racionais.
          O fato de uma idiossincrasia tão pessoal também não haveria de ser confrontado, pois amar os seres e seus predicados, suas rochas, seus reinos minerais ou biológicos, suas arquiteturas, vem ao encontro, uma possibilidade de encontrar algo, e quem sabe ouvir de um mantra quiçá fosse igualmente importante, quando a fé em Krsna dava a sua posição inquebrantável de energia motriz. Mas, visto não saber a exatidão de um fato – se o pássaro de linhas do algo cantava para os brotos da planta – seria quiçá loucura afirmar certezas, e a variante dessas dúbias certezas fazia da vida de Emília o processo algo alquímico de perscrutar a vida… Sem saber exatamente qual o processo, mas apenas deixando fluir a sensibilidade ainda aflorada mesmo sendo uma mulher mais madura. Sem cânones, sem ortodoxias, sem o dogmatismo ferruginoso e cru e cartilhesco. Seu nome a guardara para os seus, e seu paradoxal e íntimo entendimento das coisas que a envolviam, quase na fração da palavra coisa – em se tornar objeto de uma palavra – mostrava a ela que a mesma humanidade recente da espécie teria sido a mesma em longos e longos períodos, tratando-se de milênios, de tempo eterno, um fator em que não sabemos muito o que não percebemos quando das dimensões exatas do incomensurável poder da Criação. Emília pensava ser criacionista, um termo neológico, talvez, mas não efetivamente, um termo existente, que em síntese diz da criação não humana, possível portanto, enquanto pudermos dentro da notória inteligência da Natureza afirmarmos que jamais seremos os donos dela e que, portanto, não somos os únicos criadores de algo, pois se a vida imita a arte, na verdade a arte é que imita a vida. Se criamos uma tela, um engenheiro maior criou a árvore e seus pássaros e seus Éden pode ser mais plausível do que a repetida alocução da ciência. Breves são as nossas certezas, como a linha do tempo de um display: a tradução literal de como a humanidade finalmente encontra encaixe na ilusão do meio e da mensagem, posto fato da inexistência em baixas frequências de fama. Aqueles que pertencem ao uso ilegal do mesmo display resolvem sua fama em penas consuetudinárias à falência de seus grupos, no que tange a uma organização suspeita já em seu começo. O novelo das telas planas será criarmos esferas digitais, com inúmeros e inteligentes olhos. Passa a ser patrimônio do conhecimento a ciência que respeite as vertentes criacionistas, pois será através de um respeito igual – e que seja recíproco na tolerância dessas vertentes com relação a outros cultos – àqueles que biblicamente estão ativos, pois muitos grupos de bem surgem com trabalhos de recuperação de vidas com carências onde as escrituras sagradas dão de alimento e de alimento espiritual igualmente. Para cada um perdido na esteira de carências aparentemente insolúveis, pode ser a Bíblia Sagrada um caminho maravilhoso de conscientização do divino, de aproximação com a adaptação social e, principalmente – quando de trabalho consciente ao máximo – a redescoberta da paz que Jesus Cristo legou à humanidade e, ao menos, que se compreenda o lírio do campo e o grande Sermão da Montanha. O caminho deve ser de luz, para que se possa afrouxar o cinto de outros que creem ser combate: o vão, o sosso, o inaudível combate que não deve existir jamais, pois de guerras o planeta está infestado!

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