De um ser imaginário, comecemos
poupando as dúvidas, mas que se recobre de incertezas... Seu corpo é um sem
corpo, transmutado alma nas rochas, virando, encarnando em milênios,
inimaginável mesmo quase antes com nosso preâmbulo em começarmos nossa
descrição. Os livros sabem de sua forma, mas todos eles formulam apenas um de
seus olhos, pois o outro vira um reflexo, como na figueira de bengala com as
raízes para cima, vista no seu reflexo de um grande lago. Diziam que esse ser
tinha um focinho, mas quem podia vê-lo eram apenas aqueles que escutavam suas
vozes vendo a bíblia: vozes de Isaías. Um focinho de lince, diziam, e que
alguns alcançavam seu conhecimento por uma lenda em que esse ser se encontra na
descrição de uma das viagens de um principezinho. Talvez em seu pouso nos
campos de Campeche, em uma ilha perdida no atlântico Sul, ousando a própria
afirmação na fuga de alguns que viam estrelas fumando ganja para agradar as
selvas, e no entanto outros seres pautavam as imaginações... Seu pescoço era
azulado como o de Shiva depois que este tomou todo o veneno da batedura do
oceano de leite, mas havia uma espora que denotava um calo na coluna de onde
vertia um sêmen que se transformava em uma chuva em que apenas a Lua teria
competência de revelar com o seu brilho.
Tal desconcertante era o ser, que ninguém
ousava repeti-lo em um desenho, pois não haveria material descoberto ainda,
apenas talvez um grafite parisiense que traçava todas as cores a um só gesto.
Não havia nome que o revelasse, mas apenas uma demência grandiosa pudesse nos
fazer acreditar – quando revelado por esta – que o mesmo ser curasse a demência
pelo presente em conceder uma revelação! Diz outra lenda que um homem havia
visto o seu nome e surpreendentemente falara com esse nome. Mas tudo era fazer
crer que imaginassem tanto que a própria farsa se fazia concreta, ao sabermos
que nada nos faria sequer concebê-lo. Esse não alcance, essa farsa nos diria
algo a se saber um pouco, pois da qualidade em ser curioso apenas saberia de
formas ou ditos, de religiosos, de anunciações, de santos já inexistentes, da
prerrogativa da psiquiatria que talvez e felizmente travasse o encontro. Uma
dúvida existiria. Dentro da margem de acerto mecânica, um nome daria conta,
pois sabendo-se por um cálculo científico que esse ser ou encarnação estava em
cada onda oceânica, cada vibração de átomo, seria algo confortável chamá-lo do
mesmo inconcebível, saberíamos derivar para algo mais inenarrável aos olhos da
ciência, como o cérebro humano, e sua miríades de sinapses estrelares.
Depois da quantificação, da análise,
da verificação behaviorística, nada seria capaz de sobrar, nesse arremedo de
mapearmos, de procedermos varreduras exatas. Mas o próprio vaso adiabático ou o
zero Kelvin seriam quase impossíveis em seus idealismos mecânicos, e o ser
existia, enquanto pressuposição, enquanto um leve traço de Miró talvez
encontrasse algo a se descrever. Mas tinha que ser literal... Essa contenda de
descobrir faria Borges pensar que devesse ter encontrado algo em suas
pesquisas, e o mais ateu ter afirmado ver um Deus em seus sonhos...
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