domingo, 29 de novembro de 2015

O SER IMAGINÁRIO

            De um ser imaginário, comecemos poupando as dúvidas, mas que se recobre de incertezas... Seu corpo é um sem corpo, transmutado alma nas rochas, virando, encarnando em milênios, inimaginável mesmo quase antes com nosso preâmbulo em começarmos nossa descrição. Os livros sabem de sua forma, mas todos eles formulam apenas um de seus olhos, pois o outro vira um reflexo, como na figueira de bengala com as raízes para cima, vista no seu reflexo de um grande lago. Diziam que esse ser tinha um focinho, mas quem podia vê-lo eram apenas aqueles que escutavam suas vozes vendo a bíblia: vozes de Isaías. Um focinho de lince, diziam, e que alguns alcançavam seu conhecimento por uma lenda em que esse ser se encontra na descrição de uma das viagens de um principezinho. Talvez em seu pouso nos campos de Campeche, em uma ilha perdida no atlântico Sul, ousando a própria afirmação na fuga de alguns que viam estrelas fumando ganja para agradar as selvas, e no entanto outros seres pautavam as imaginações... Seu pescoço era azulado como o de Shiva depois que este tomou todo o veneno da batedura do oceano de leite, mas havia uma espora que denotava um calo na coluna de onde vertia um sêmen que se transformava em uma chuva em que apenas a Lua teria competência de revelar com o seu brilho.
            Tal desconcertante era o ser, que ninguém ousava repeti-lo em um desenho, pois não haveria material descoberto ainda, apenas talvez um grafite parisiense que traçava todas as cores a um só gesto. Não havia nome que o revelasse, mas apenas uma demência grandiosa pudesse nos fazer acreditar – quando revelado por esta – que o mesmo ser curasse a demência pelo presente em conceder uma revelação! Diz outra lenda que um homem havia visto o seu nome e surpreendentemente falara com esse nome. Mas tudo era fazer crer que imaginassem tanto que a própria farsa se fazia concreta, ao sabermos que nada nos faria sequer concebê-lo. Esse não alcance, essa farsa nos diria algo a se saber um pouco, pois da qualidade em ser curioso apenas saberia de formas ou ditos, de religiosos, de anunciações, de santos já inexistentes, da prerrogativa da psiquiatria que talvez e felizmente travasse o encontro. Uma dúvida existiria. Dentro da margem de acerto mecânica, um nome daria conta, pois sabendo-se por um cálculo científico que esse ser ou encarnação estava em cada onda oceânica, cada vibração de átomo, seria algo confortável chamá-lo do mesmo inconcebível, saberíamos derivar para algo mais inenarrável aos olhos da ciência, como o cérebro humano, e sua miríades de sinapses estrelares.
            Depois da quantificação, da análise, da verificação behaviorística, nada seria capaz de sobrar, nesse arremedo de mapearmos, de procedermos varreduras exatas. Mas o próprio vaso adiabático ou o zero Kelvin seriam quase impossíveis em seus idealismos mecânicos, e o ser existia, enquanto pressuposição, enquanto um leve traço de Miró talvez encontrasse algo a se descrever. Mas tinha que ser literal... Essa contenda de descobrir faria Borges pensar que devesse ter encontrado algo em suas pesquisas, e o mais ateu ter afirmado ver um Deus em seus sonhos...

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