sábado, 7 de novembro de 2015

RELAÇÕES DO DIREITO

            Qual, eu não estava disposto àquele dia em conversar com o advogado. Minha vida tinha sido tão atribulada até então, o que havia urgência em tratar certos assuntos e eu escrevera minhas referências, a grosso modo, nos limites em que me lembrara daqueles. Era um processo longo, e não conseguira ler – entendendo – nem um par maior daquelas páginas. Continuava na mesma, e não sabia que o direito era tão complexo para alguns que dele tratavam os, por vezes, mestres nessa cátedra. Me ressentira um pouco, mas na minha vida talvez tivesse gostado se houvera escolhido seguir essa carreira das letras. Não viveria para atender o patronato, certamente, mas para acolher pequenas e, no entanto, graves causas. Porém, essa questão já havia passado, e o que importava era o presente, apenas. Tudo o que eu sabia das letras estavam nos jornais, mesmo que me faltasse um dos bons, como nos antigos tempos de nosso editorial pátrio. Nunca me faltavam as palavras, mas daí talvez viessem os clássicos, pois entre eles Cervantes e Camões eram quase uma guia, tanto que suas estrelas como patrimônio literário da humanidade brilhavam forte. Pelo menos que a humanidade das letras lessem algo tão substancioso como as palavras antigas, assim como eu considerava em meu modo de ser, pois tinha a esperança que as crianças destas novas gerações lessem coisas boas... Tantos os manifestos de nossa cultura universal!
            Bem, saí de casa levando um maço cheio de cigarros, uma predisposição de um atleta sênior, caneta, óculos e um pequeno caderno, anexado ao processo, onde eu anotava dúvidas sobre dúvidas. O encontro com o advogado fora de praxe, pouco havia de ser resolvido àquele dia. Pensei em Camões, na volta para casa. Como ele gostava do mar, de bom português que era, e que suas palavras e livros ajudariam o direito, pois versava também em suas poesias muitos versos que nos esquecemos de ler, nesta vida curta em nosso mundo. Quiçá renascendo encontraremos um outro Camões, mas isso é impossível, já que o gênio já nasce em seu próprio direito, em seu próprio tempo. Esse direito que temos, agora em nosso tempo, na diluição própria de qualquer arremedo do gênio, ou de um que porte genialidade, pois cada vez mais sobram parabólicas e suas parafernálias e faltam antenas humanas. Talvez seja o direito a manifestação mais cabal do Estado, pois suas leis aplicadas, quando sempre, definem o modo de nos portarmos no espectro grande e maior que são os Direitos Humanos, em que qualquer predisposição contrária peca contra as razões que alicerçam a justiça magna internacional.
            O trânsito em largas avenidas conferia quase um caos, mas seus sinais – pensei – eram breve amostragem do funcionamento de uma via pública. Essa era uma razão primeira, para mim, pois levar uma mãe idosa frente a um mar de carros sempre é uma tarefa delicada, e o mesmo carro tem que estar em boas condições, como um objeto que usamos, uma máquina, como são os barcos, os ônibus, os trens... Falei muito pouco naquele dia, telefonei para uma amiga e comprei, sob uma chuva torrencial, um acessório de informática que serviu como uma luva. Carreguei com cuidado sob um guarda-chuva chinês que a mim me parece ótimo, pois já dura alguns meses sem arrebentar as varetas, sequer. No entanto as chuvas vinham mescladas com um vento que fazia do guarda-chuva uma peça fadada ao descarte, virando as varetas, a se carregar contra o vento, como um barco que apresenta às ondas a sua proa, indo de encontro a elas para não virar. Assim seguiram aqueles dias, uma parte escrevendo e outras quiçá lendo, mas eu não me importava se alguns nem sequer citavam meus escritos, escondidos sob a capa do ignorar-se algo que não procede em padrões que seja na quebra de um tabu, ou seja, na existência francamente normal de um que porta a enfermidade que seja, quando se alcunha que o especial é aquele que demanda a própria ignorância, e que não seja dado a ele a alcunha salutar da "normalidade", não é mesmo assim a receita sistêmica? No entanto, a própria questão da mesma enfermidade, seja qual for, nos coloca frente a frente com os iguais em sofrimento, e que evitam qualquer aproximação – na lógica do genoma bem comportado – com a realidade dos que sofrem pela espoliação de sua cidadania por possuir carga genética com “defeitos”... Apenas esta seja uma pincelada traduzida em um parágrafo de um homem que acredita ser feliz, e o é efetivamente, pois não busca nada que não seja o seu aperfeiçoamento espiritual, a própria razão direita em se prosseguir na sua lide paragonada pelo tempo que não lhe assusta, pois sabe que a velhice é uma etapa que deve ser cumprida, apenas sabendo-se que é uma questão existencial que demanda bons cuidados em si mesmo, a princípio...

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