Despertei àquelas duas horas da
madrugada quase imberbe, me encontrando com um espelho sem fundo, qual não
fora, apenas meu reflexo. Enquanto subia meu olhar do chão, me vi
estranhando-me em imagens, o perplexo farfalhar do mesmo reflexo... Havia gente
no meu quarto, de noite anterior, as roupas deixadas no banheiro induzia a
saber da mesma noite, o que fizera ou deixara a ser feito outra hora, que me
ressentia a uma náusea praticamente a não ser resolvida no que restaria dos
restolhos das manhãs. As vertigens eram naturais, fossem o que realmente eram,
mas a paz me fazia refletir sobre o mesmo espelho daquela madrugada, qual
superfície branca inexistente, entre tons violáceos puxados ao rubro nas luzes
que cria amarelas dos postes noturnos. Me encantava com tudo e tudo teria solução,
naqueles tempos em que passeávamos na orla marinha já percebendo os pássaros –
incrível! – como privilégios existenciais. Nisso de ver um afago de um casal,
nisso que alguns homens possuem a gana de estar bem com uma mulher, amando-a
sabendo-se ser amado. Mas que ela soubesse, a um homem devia ser o suficiente,
pois o amor por um lado não deixa de ter sua boa e maravilhosa semente, no que
o olhar do arrependimento pode vir da luz ressurgida de um caráter, o que espelha
no ser as esperanças de que nos acertemos todos no mundo...
Como é terna a palavra que não
existe para sobreviver, mas que emana da vida o sentimento de uma nobreza que
pode vir de um mendigo até um chefe de estado. Não há ternura pouca, mesmo que
uma gota emane sincera da fonte serena em que reside um olhar, e quando vemos
esse olhar, devemos ver com transparência, pois vem do espírito, da alma, e
ressurge quando é compartilhado, ao darmos tréguas por muitos sofrimentos que
sofremos ou causamos por vezes na ingenuidade de nossas tíbias referências,
enquanto solidez de mensagem, enquanto verdade de um fato bom, que seja, um bom
filme, um parágrafo de um livro, um conto, uma poesia que não gere quaisquer
manifestação de lutas que não sejam aquelas que podem vir do encontro com uma
consciência das coisas naturais, assim, de não sermos predadores, pois estes já
existem na Natureza e suas vertentes.
Nascera como sempre meu sono
atrapalhado naquela madrugada, mas voltei a dormir. Estava exausto, meio
apaixonado por uma mulher maravilhosa: a mais bela, a mais forte, e me causava
uma impressão tamanha que não suportava a ideia que fosse assim, pois meu amor
estava preso há séculos, e eu não podia admitir que amasse, pois que tinha medo
de sofrer algo de um amor, mas sabia que um poeta dizia que todo amor vale, que
todo o amor ressurge das montanhas, que todo ele é no mínimo uma fração de
grandes esperanças compartidas, a partir da história de cada qual...
Mas aquele dia era meio solitário,
sonhara na noite com um beijo, e este não tinha muita narrativa, era uma
represa, um lago em potencial, um sôfrego alimento de um pequeno ser. Acabei
por escrever pequenas linhas, tortas no entanto em estado de um ânimo sequencial,
como a arte de um quadrinho, em que olhando-me no espelho apenas tomei contato
com o corpo cansado de um homem que infelizmente para a sua história amorosa
despertara muito tarde para tanto,
mas que em compensação o amor que nutria a Krsna me fazia repirar dentro de um
espaço infinito onde as raízes fecundas, através dele, alimentariam todos as
folhas possíveis dentro de uma vertente mais gigante do que o encontro entre um
par.
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