terça-feira, 24 de setembro de 2019

UMA SOLIDÃO ANUNCIADA


A porta que se abre, tantas e tantas vezes, fechando-se na ventania,
E Clara vendo a janela com suas grades, de uma face nua na arquitetura
Qual não fosse uma janela desnuda, sem a grade, sem o fechamento…

Visto que fosse uma, mas era Clara, ressonando
Depois de uma refeição de domingo, Clara dos anéis
De Saturnos em seus dedos, formigando a pele, cansada
Das ofertas generosas em ligações telefônicas, os serviços
A que quisera estar ausente, a que Elaine não percebera
Que a ausência de si vinha a cumprir a meta proposta
Nos caminhos túrgidos da profissão nebulosa…

Trincando os dedos sobre o ferrolho da porta
Clara sabia apenas das visitas, não da conotação do prazer
Que antes não houvesse, os dedos crispados no colo
Em orações nubladas, a tentativa de não cometer erros,
Posto a falta da amante, que não envidaria esforços
Em retocar a mesma maquiagem que porventura fazia a cor
Sobressair de seus lindos lábios, turvos e provocantes
Em alguma calada de bares que entorpecem, claudicam, fazem cair!

No sono a queda, que fora de uma razão algo próspera, posto o fato
De saber-se atuante, profissional, vertente de alguma gorjeta, afora
O que de saber-se mais não se houve no querer ter merecido algo…

Dos beijos em seus seios maduros, da pele acobreada de um negro
Sabia-o quiçá melhor dos seus colos de mulher na mesma madurez
De um carvalho intocado de suas superfícies, na vista de um fogo
Tardiamente despertado porquanto resolvia-se na própria contramão.

A se desvendar quilates, a se sobrepor tessituras, a alimentar-se de pão,
Quisera Clara estar com qualquer interlocutor sem as frases de rebatimento,
Sem o dizer-se a não dizer, sem os ensaios de algum tipo de treinamento
Qual não fosse o toque terno nas alfombras secretas de seu corpo.

Vertia quiçá um tonel de vinho sobre o mesmo tempo em que Elaine
Fosse uma companhia de vento morno, um mormaço de inverno,
Um calor qualquer que subisse ao seu ventre, uma misantropia cálida
No revés de um arrependimento que não se falava de alguma hipocrisia.

E esta era a sua solidão, pois tentava um amor secreto, posto na sua vida
Não surgissem muitos homens, não se refreasse o ardor de seu tórax pleno,
De suas perdas fatigadas pelas desordens de uma luta em se manter
Algo serena e franca, que não se retesava a coluna, seus lombares funcionavam.

Ao corpo e ao corpo, transformado em células sensíveis, de poros vivos
Na vida que pedia ser um pouco mais do que o mesmo de sempre, quanto a si
Soubesse que a mesma vida abriria seus farnéis para retocar uma muralha
Reconstituída de totens, perdidos em uma selva, onde nem se encontrar se fora!

Queria ser mais do que apenas Clara, queria ser um corpo infinito,
Veste mesmo que do fracasso, um fracasso em fim, mas de cotidiano
Vívido como a esmeralda de seus olhos, mas com um semblante
Que olvida a forma de tentar ser mais do que um misto de espírito nos redima…

E lembre-se a mulher de seus encantamentos que Deus carregou como grandes
E que nada nos impeça de dizer dos erros de uma Criação que não renegue
Que mesmo a uma autoridade imperecível remonte a beleza tão nobre e perfeita
Que é o rebentar de um pistilo e de uma safira nos corpos tênues do feminino…

Qual não fosse, o que encontraríamos por demãos de tinta na arquitetura divina
Se não fosse a nossa grande casa, a casa por vezes de muitos aflitos
Mas que ensombreada fica mais terna, à medida que um olhar de mulher
Ressalte que são muitas as Claras que temos em uma volta do que seja assaz raro.

Mas daquilo que seja raro em nossa busca, lembremos da solidão de um ser
Quando percebemos que a mesma crença de que não estamos jamais sozinhos
Perfaz dias em que a mesma veia de uma parceria poética nos encontre a companheira!

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