segunda-feira, 23 de setembro de 2019

MONÓLOGO SOBRE O SOFRIMENTO


          Tantos sofrem, meu Deus, que sei eu sobre o sofrer… Há que se ter em vista que presenciar o sofrimento humano é quase como um lugar qualquer, e nos tornarmos empáticos com isso faz a diferença entre sermos humanos ou quase animais, postos não sermos estes, já que não somos superiores a nenhum ser sobre a Terra. De sofrer-se há cátedras, há gentes que sofrem todos os dias, mal pagos, explorados, doentes, injustiçados, por vezes quiçá vítimas de um sistema nefando, que exclui, que compete com os mais fortes no páreo, que emparelha cavalos mal treinados com alazões puro sangue sem contendores à altura. Quem dera o poeta não sofresse, mas a doce ilusão é pensar que quando estamos totalmente felizes, dentro desta esfera material: copulando, nos intoxicando, viajando a esmo sem nem saber exatamente para onde, usufruindo tudo, enquanto a vida vai passando e não teremos construído nada além de castelos vulneráveis porquanto matéria em si, dinheiro, acumulação e votos orgiásticos sem a performance sequer de saber de onde vem uma riqueza que não perdurará no altíssimo céu, que espera aqueles que sofrem, quando se doam para si mesmos a retórica de existir com tantas as dificuldades da vida e as suas carestias.
          Sim, a vida é dura, é condição sobremaneira díspar do que pensamos que somos porquanto termos um lar, filhos bem situados, e gentes e gentes na miséria. Não, diriam alguns, estão na miséria porque não souberam aproveitar as oportunidades, nessa condição abjeta de não saberem nem ao menos viver, mas que nos sirvam com sua força de trabalho, pois através dela, a dizer devidamente explorada, eu teço o meu império. Mas que houvesse um império, mas um império de se sentir lisonjeado, qual não fosse, algo de real estatura, de monta maior, que estaríamos quiçá mais orgulhosos. Com Roma quiçá, o que revelou-se uma realidade imperial: inteligente, respeitadora de certas culturas, um vaso que não se rompesse, mas com um erro recorrente, ter colocado o Filho em sacrifício. Errou grandemente e os povos que foram responsáveis pelo erro de se ter morto o Messias.
          Quem sabe a crítica seja uma ilusão tamanha, quem sabe todas as gerações possam encontrar a similitude com algo que lhes dê esperança. Não haveria de haver divisores de água, nem o rancor de estarmos esperando um desfecho de algo para ver quem alcança uma salvação esperada. Certamente o sofrimento é um modo existente em todas as classes, pois a doença e a velhice passa por ser uma certeza, e o homem e a mulher não surgem para uma vida no paraíso, pois este nosso mundo é como se fora uma passagem, mas se torna uma passagem cada vez mais estreita pelos vales que contém as dificuldades do planeta.
        Quem dera esse monólogo fosse mais do que se dizer o previsível, mas a conclusão que tira este que vos escreve, e que sofre o suficiente para compreender as latitudes existenciais dos seres em geral, talvez saiba de certa cátedra onde mais valeria um sofredor entrar no reino dos céus do que uma colocação importante nesta selva material fosse resultar na certeza de uma boa garantia que viesse a acontecer em um futuro que se torna previsível, porquanto resultado de Kala, o tempo eterno...

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