Seria
bom termos cadernos culturais, na medida em prosseguirmos com a arte,
a escultura, o desenho, a tecnologia, o modo de praticar mais do que
um alfabeto, mas se necessário for, que saibamos dele o que é
melhor para fugirmos desesperadamente – como imagem retórica
apenas – de uma manta escura da ilusão que nos impede ver com
olhos o que deve ser a transparência como de um cristal que nos
abrace o fazer artístico, em sua construção e em sua expressão.
Não deve haver qualquer nível de coerção à manifestação
cultural e, no contraponto civilizatório, as nações indígenas
devem ter todos os direitos a que lhe destina a humanidade no máximo
teor libertário e territorial, como um exemplo que já devia estar
na pauta prontamente realizada desses direitos em todas as faces
étnicas, gerais e irrestritas, extensivas principalmente na justa
planificação de nossos entornos, no que vamos dar à defesa da
Natureza. Essa é a colocação de fundamento veraz em que nem todos
que estão com toda a tecnologia nas mãos podem afirmar que são
melhores do que outros que surgiram de outros processos
civilizatórios e que, paradoxalmente, começam a se afirmar melhor
como exemplo de interação com a terra como um todo, onde a
agricultura tribal ou familiar, não necessariamente indígena versus
não indígena, são o único modo de superarmos os problemas da
toxidade alimentar, ou ao menos que se atenue o problema, com o
acréscimo da agricultura nos nichos de espaço de nossas cidades,
remontando que imitemos, que sejamos mais “tribais” e gregários
nessa apreensão da realidade…
A
terra é a finalidade em si mesma. Se vivemos em uma região com um
clima propício, se as flores brotam das árvores podemos, sim, estar
convivendo com a realidade do plantio, de um retorno ao pressuposto
de que dele nunca nos ausentáramos. A perma cultura é uma saída
viável, a troca, uma economia solidária, a participação
tecnológica, visto. Mas nunca resolveremos problemas sistêmicos de
ordem econômica e principalmente cultural se não nos aproximarmos
da própria cultura manufaturada, ou seja, a peça, o vaso, o barro,
a terra, a semente, o caule, a folha, o fruto, todos os elementos que
surgem da terra, e, simultaneamente, a compreensão de que a sílica
vem da areia, e desta que o melão e a melancia são igualmente
alimentos… A grande revolução é um retorno a um mundo sem o neón
dispensável dos “coletores” de nossa percepção sensorial, que
nos refugam a um ponto em que o prazer vem dosado de tal forma que o
chauvinista se torna mais chauvinista, e os gêneros se tornam cada
vez mais distantes, pois que dispomos de um fogo que é ateado sempre
e, mesmo que não queiramos, a tecnologia dos selfies nos
empurra para mais um estímulo e resposta do ódio, de uma luta sem
propostas, do embate, da tomada crua do poder, de um não ser
necessário onde a fuga torna-se o Nirvana!
Só
há uma plataforma: a paz, o diálogo, a não contenda, o bom combate
na argumentação e na sensibilidade que as pessoas que não deixaram
a sincera ternura de lado conhecem como premissa básica do
entendimento. Se não há entendimento, parte-se para a lei, se não,
haverá sempre o protesto. Mas precisamos elucidar a nós mesmos onde
erramos, e é nessa busca saudável de nossos próprios erros e
acertos, uma busca de sempre, que encontraremos mais luzes onde
estão, e a face oculta da lua que, no entanto, igualmente existe,
senão não haveria o contraponto de Bach, a textura, as literaturas
diversas, a pintura surrealista: o por vezes absurdo e desconexo, o
encontro, as diferenças… Essa é a seara do outro plantio, por
vezes mais árido, onde não há por vezes a terra, mas o concreto.
Onde não existe sempre um ideal, por vezes apenas uma hierarquia,
uma relação de Poder. Nesse contexto não há paradigma, se é será
isso nesse contexto específico, mas o plantio é um modo de
mostrarmos que a cidadania é igual para todos os habitantes do
planeta, e se há insalubridade que seja em um país, que seja dada a
bandeira de outro para ser hasteada em nome da hospitalidade, e que a
cultura dos mesmos países necessitados vejam que conseguirão semear
algo igualmente no concreto, que podemos – aí sim, no bom e
incansável combate – preservar nossas águas, democratizar nossos
propósitos, crescer conjuntamente com todos os povos, aprender
idiomas, respeitar as etnias e culturas que descem às cidades, ou
que subam para regiões mais frias, em síntese, tornar um país algo
de florescimento da bondade e da determinação de ser melhor para
todos. Só a partir dessa plataforma mais equilibrada e coerente é
que podemos pensar melhor para a frente, na intenção de caminhar
para uma democracia cada vez mais participativa.
A
utopia estará sempre nos esperando, não apenas no que se apresentou
nos canais como economês algo rancoroso e gasto, mas em um platô
existencial que se sente no olhar, que um gesto reitera, que há
predomínio da preservação do patrimônio de nossas culturas, de
nos sabermos índios, algo hispânicos, meio italianos, um pouco
germânicos, muito africanos, belamente sulistas ou nortistas, fortes
e corajosos nordestinos, um país, um planeta, sem diferenças entre
o que seja, com a distribuição de riquezas mais equânime e,
principalmente, que não nos metamos em querer brigar com nenhum
país. Que saibamos nunca ser violentos e ser mais tolerantes quando
pudermos tecer o mesmo diálogo necessário. Algo de cultura que
insistimos em nos fazer crer é acreditarmos que a tecnologia é um
deus… Longe disso. Não precisamos de nada para sabermos que a
Natureza é abençoada, no sentido de nos fazermos entender: as
formigas, por exemplo, estão em seus papéis de trabalho. Não
devemos desviá-las do caminho, pois seus fardos são maiores do que
os nossos. Os pássaros encantam o nosso céu e quando não os
encontramos devemos saber que temos que plantar árvores e que nossas
crianças aprendam isso.
Devemos
sim pontuar pelo progresso civilizatório como bem explica melhor
qualquer estudioso bem aprofundado de antropologia, como o grande
Darci Ribeiro. Todos os seres humanos tiveram seu nascimento e
desenvolvimento através da linearidade do tempo. Esse mesmo tempo
possui a mesma linearidade, somos iguais perante a Terra. Nunca houve
reais proprietários Dela. Essa mesma Terra-Natureza-Mãe, feminina…
Rendamos graças se podemos ainda tomar conhecimento de nossos erros
perante Ela e requisitar nosso perdão, pois devemos pensar algumas
vezes com o fato de querermos nela pousar nossas garras pois, como
Durga, não é coisa que se brinque e o chauvinismo exploratório
sempre perderá, é apenas uma questão do tempo eterno, este ente
que espera nossos atos e os julga, como um pássaro que desfruta, que
somos nós, a espécie, e outro que apenas observa, que é Krsna...