quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

UM SER DA MONTANHA

            Por uma praia distante dos roteiros paradisíacos, de feição urbana já, de antes claramente rupestre, se vê uma montanha. Uma azulada montanha azul da perspectiva aérea, em que sentimos viverem por lá alguns seres... Quiçá seres que não vemos quando perto, pois sentimos distantes nessa realidade com sombras, a que diste, talvez nos vejamos neles. Sua pele pode ser de calcário, conchas perdidas nas rochas, os costões talvez existam mais longos do que o quebrar das ondas que não vemos... Talvez viva um homem barbudo, inadaptado ao que não seja a selva, meio índio, meio sereno, no serenar de rochas que ele encontra, e que da distância desconhecemos... Por hora que virasse meio anfíbio, salitrando gotas de resistência, no recrudescer de suas lutas. Mas não, que por onde o criamos em nossa especulação, as carochas de metal passam esbaforidas e o câmbio se sente nas passadas. O ser montanhoso vive de uma cultura milenar, enquanto o ser que deveria prosseguir montanha verte seu sonho em uma alfombra digital, como um papel onde sobrescreve mitos. Vanapastra é seu nome, e algo de hinduísmo lhe aflora o cerne, que tal, era hora de não hesitar na renúncia. Mas baste-se algum nome, que se lhe chame Bhisma, daria de se contar histórias védicas jamais escrutinadas pelos votos daquilo que jamais pensamos. Difícil seria imaginar tantas rochas, que não são mais imaginação, posto existirem em sua imensidão de caminhos. Que margeiem nenhum obstáculo o caminho que nos leve em um barco, ou mesmo na terra onde nos descaminha os montes mais altos. Seria aliviar um pouco o fardo, ao que se desse ao menos as palavras que norteamos em bússolas de espectros em criaturas noturnas, e seus cais particulares ao redor da ilha. Na ponta de Cacupé, em aldeias sambaquis, nos canais da contra cultura a se refazer melhores dias nos reconhecimentos territoriais. Desce um declive, aponta-se uma casa, mostra-se um duende que só existe em maquetes. No que verse, uma manchete que mostre um duende mais personalizado, mesmo em cartola que se revela ofuscada nos jornais. Seria talvez insanidade afirmar algo distinto, mas a insanidade é válida para descortinar oxigênios, por vezes.
            O que é de se afirmar que o homem da montanha não veja por hora os trocos irrisórios de uma campanha difamatória, ou o que de mal vai na sociedade, as maletas de dinheiro, as calúnias, os preconceitos. Mantenha o homem a sua renúncia, pois que é de aldeia se coloque perto de uma árvore, ou descubra fontes que nunca serão encontradas, pois pertencem à madre Natureza: santa Madre! Madre em seus rabiscos, em que a rabiscam a superfície, ao que a ela se denote que verte água pelos poros, que aumenta seu humor na temperatura, que mostra ao homem – não ao da montanha – o que o homem faz com ela. Nem com ela, a si mesmo, em sua estúpida ignorância, queimando o óleo firme, queimando seu próprio tutano dentro de suas digitalizações inócuas, quando disformemente comanda o atraso, as guerras, os ódios, os saques e a devastação, que engloba tudo enquanto destruição inata da qualidade da espécie sapiens: enormemente “evoluída”. Caros amigos, reinventem seus próprios sistemas, a parar de apropriar-se, que estamos nos apropriando do nada, em que o nada convexo nos mande saber que no fim o clamor popular ainda é a tomada de consciência mais salutar, pois seu conhecimento pode valer de mais bagagem e compreensão das coisas, e não a tipificação da sobrevivência apenas, enquanto alguns discutem a natureza dos cruzeiros marítimos. Talvez esteja tudo bem, mas que crescer as gentes é factível, é de boa natureza.
            O homem da montanha parece tudo ver, mas vê nas entranhas da Natureza o que há para se conhecer, ou sentir, ou prescrever a si mesmo, nos melhores modos de compreensão do que são os seres, e por esse ponto chegaremos na questão mais estável do conhecimento: que cada folha, que cada gomo de bambu, que cada naco de terra saudável, que um inseto navegando generoso em sua idiossincrasia é mais, tudo é mais do que supomos, e é nesse micro que devemos aprender, pois preservando o entorno preservaremos a nós mesmos e à ciência maior de compreendermos próximos a uma totalidade mais saudável. Sem essa consciência não somos, sem isso não existiremos, pois não adianta vermos uma peça de teatro se o dramaturgo nunca pisou seus pés na terra...

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