sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

O INVENTÁRIO MORAL DE UM HOMEM (II)

 

        Seguimos na senda de relacionar coisas que não são muito boas para um cidadão e outras que facilitam de qualquer modo o caminho da recuperação. Uma coisa muito importante e um pouco rara na era contemporânea é a humildade. Se por ventura cruzamos o caminho de gente extremamente arrogante, é sempre bom mantermos aquela qualidade do bem portar-se para que não recrudesçam possíveis desavenças, naquilo em que por vezes precisamos olhar para o chão a ver, não propriamente ser espinha mole, mas prestar atenção nos lugares onde pisamos nossos pés. Desse modo, as possíveis e reais ofensas seguem seu curso natural e o veneno da serpente não nos é inoculado, literalmente, pois o animal não faz nada – salvo exceções – quando não provocamos um litígio que, quando estamos sem o controle de nossos atos, acontece frequentemente. Essa humildade é muito rara quando estamos tomados por substâncias psico ativas, tais como o álcool e outras drogas.
        Um dado outro importante para se ressaltar é a vontade de poder na vida materialista em excesso. Carl Jung já colocava em xeque esse desejo que a humanidade carrega dentro de si tão arraigado, expresso no Príncipe de Maquiavel, onde nada se limite a
obter algo que possa ser ruim para outro ser, mas que egoisticamente desejamos para nós, independente de quais artifícios o obtemos. Que o ser humano queira tão somente viver na paz do anonimato, aliás, a melhor saída para exercermos plenamente a cidadania, distantes de tudo o que nos seja nocivo e, novamente, a sobriedade se torna sempre necessária. Por quantas mesas de bar já passamos crendo que poderíamos ser senhores de uma rua, de um bairro, da cidade ou mesmo do mundo? Essa vontade de Poder abraça a ganância, a hipocrisia, a falsidade e outros modais do comportamento humano como característica que não estamos muito bem com relação à realidade, espelhando a mesma dentro de um processo ilusório. No entanto, vemos que há muitos que realmente são poderosos, e no mais das vezes retrocedem os atos sem saber ou ter consciência do que fazer para melhorar a vida de sua empresa, seu país ou seu povo. Essa vontade extrema de poder resulta de conceitos onde relações entre as pessoas possam estar vinculadas a uma ebriedade emocional igualmente, como uma outra forma de dependência que possa acometer ou surgir a partir de adicções que nos nuble a mente com o manto da ilusão: uma outra face da ilusão, mais sutil e mais prejudicial, enquanto “justificável”… Obviamente, este é um inventário moral de quem vos fala, ou seja, já foi prejudicado por todas essas questões enquanto ativamente portador de uma doença chamada alcoolismo, e que agora começa a fazer uma releitura de seu próprio caso, onde a complexidade desse ato remonte a humildade necessária para assumir erros ou falhas de caráter.
           Não é preciso estar em recuperação mental para testemunhar que a falta da humildade está presente em muitos e muitos indivíduos da coletividade, ou mesmo quando situados em funções de responsabilidade perante grandes conglomerados, empresas ou funções políticas. O fato de termos o exemplo de Jesus e seus apóstolos retoma a posição espiritual como necessidade de rebatimento fundamental – ou quase sempre – na recuperação da enfermidade do alcoolismo ou similares. Essa vida ou crença em um Poder Superior nos torna mais humildes com relação a Ele e portanto fica mais fácil de se encontrar uma grande força interior que nos guarneça, guie e ilumine, para que o nosso caminho seja mais de luz. Quando nosso ego crê que tudo gira em nosso entorno é que ficamos para trás na relação que temos com o planeta e esse egoísmo fatalmente nos leva a cometer desatinos e nos torna mentalmente vulneráveis para se ingerir quaisquer substâncias que nos tirem do prumo. Quando o problema com o álcool se torna inevitável e chegamos ao fundo do poço é a hora de assumirmos nossa impotência frente ao descontrole de nossas vidas ocasionados pela adicção. Sempre é bom investigarmos nossos erros, mas tudo começa na nossa entrega ao Poder Superior para que voltemos à sanidade. Esse é o requisito essencial para começarmos a ter esperança em nossa fragilizada situação. Seguir os passos é fundamental e a literatura também tem seu valor e importância capitais em nosso contínuo processo de recuperação, além da frequência às reuniões do AA.

FIM

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