quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

A ALMA DA ÍNDIA

            Um sonho é encontrar-se com uma pátria espiritual, como é a Índia para a totalidade dos universos manifestos e que ainda há por manifestarem-se. Não é pouco dizer algo como isso, já que Krsna está em tudo, nos átomos e no todo, além do Paramatma em nosso coração, como testemunha ao desfrute de nossas sendas, de nossas missões, nascimento a nascimento, desde que haja uma liberação quando atingimos o estado de serviço em bhakti ao Supremo. Isto é um pequeno preâmbulo de fé, que o digamos, necessário a um entendimento cabal entre os que desconhecem um país maravilhoso, com milhões e milhões de religiosos e sábios. Prabhupada trouxe o conhecimento ao Ocidente, ao país mais poderoso, os EUA. Dalí em diante outros países adotaram a consciência de Krsna, através de sucessão discipular, dos ensinamentos, dos preceitos védicos, da não intoxicação, da tolerância, paz, e a não violência não apenas ao gênero humano, mas extensivamente a todos os seres que habitam o planeta. Na verdade trouxe também o preceito em aceitarmos todas as religiões como caminhos de diversas culturas, não havendo por ótica humana nenhuma discriminação de cultos, ou diferenciação de deuses, pois tudo é uma coisa apenas, esse o fato que narro para mostrar aos aflitos que sofrem a discriminação de qualquer natureza que aquele que é consciente de Deus realmente é mais feliz, apesar de sabermos que o que obtemos materialmente é estritamente necessário para que possamos no mínimo manter a alma e o corpo unidos. Prabhupada, o grande líder espiritual deste último século mostra sempre que o seu desapego foi o exemplo de um homem que com simplicidade ensinou a outros que a luxúria do consumo nunca será o caminho que nos leve à religião, pois como se diz no latim: religare, esta nos liga ao mundo sob a visão em que as escrituras como o Gita como Ele É e o Shrimad Bhagavatam dão mostras do que possuímos como todo o conhecimento espiritual da Índia, dentro da plataforma do Vaishnavismo. Digo, pois chega uma hora em que nada faz mais muito sentido sem o encontro crucial com esses textos sagrados, a comunhão com a Natureza e os mantras védicos.
            Pude ter a satisfação de estudar várias vezes o Gita, e ler dez Cantos do Bhagavatam, e sou sincero em concluir abertamente que isso ampliou minha concepção do mundo, pois creio que não há muitas possibilidades de compreender o mundo sem que não haja a distinção clara entre o que é ilusão e o que não é, já que transcender muitas coisas é condição sine qua non para mim e outros devotos enquanto vivemos em um mundo onde os negócios são mais importantes do que as pessoas... Talvez seja uma afirmação libertina, mas penso que os valores financeiros estão tornando o mundo refratário, já que enquanto alguns apenas sobrevivem, aliás, a grande massa do mundo ocidental, outros tem padrões de vida muitíssimos mais elevados, não se utilizando de nascimentos em famílias mais ricas para elevarem-se espiritualmente, mas apenas para perpetuar a simples exploração predatória, a ganância e a relação de poder inequívoca para esse tipo de gente. Todo esse emaranhado está que a alguns pode parecer uma contradição inerente a sentimentos de fé originalmente despojados de utilidade por receitas ou interpretações arcaicas, mas que às grandes massas que incorporam o evangelho nas sociedades, desde há gerações, temos a impressão de que não podemos passar sem esse fato.
            Caramba, por vezes parece uma pretensão de desafogo, nada mais, tentar erigir um edifício sobre pilotis que hão de passar por crivos, mas que não importe, pois o panorama da civilização passa por uma questão de profundas diferenças religiosas. Podemos ser Hare Krsnas, mas igualmente podemos ser evangelistas, judeus, católicos, muçulmanos, umbandistas, jainistas, budistas, ateus ou agnósticos. Incluso a idolatria deva ser respeitada profundamente em nossos alicerces culturais, pois africanos e indígenas também possuem – de modo extremamente rico – seus ritos e cerimônias religiosos. É nessa miríade de crenças, de misticismo tipicamente emergente e um certo dogmatismo de contraponto em países mais ricos, que vemos uma fusão em que paralelamente o atrativo display tecnológico passa a ser adorado como mais um totem em seus diálogos por vezes sem sentido, mas que azeitam a máquina da compreensão da mesma. Não haja a separação maniqueísta de sermos superiores em termos de compreensões de qualquer natureza, pois que não há mais superioridade no gênero humano, já que a mesma intolerância abraça todos os povos e há ainda a se respirar, justo, na pátria latino-americana algo que envolve de humanismo àqueles que lutam como trabalhadores, os empresários e certos governos, que passam por ajustes de importância crucial, no que agora terão que sobreviver enquanto estamento político a partir da anuência das bases sociais. É esta a fundação do edifício, de sapatas profundas e largas, o que nos pressupõem tornarmos bela a fruição de uma boa arquitetura, ou das assistências exatas da engenharia... Negar esses pressupostos é negar uma lógica que não se nega, pois não há como enveredar por um caminho em que a Verdade não a pertença.
            A alma da Índia é sobremaneira maravilhosa: mais de bilhão se seres compondo uma nação, e o simples mergulho na mãe Ganjes mostra ao mundo que muitos são os sítios sagrados, e que o mundo Oriental encerra em si mesmo seu próprio modo de orientação espiritual, econômica e existencial, em que nos parece talvez cedo para compreendermos, mas que não está saturado como o Ocidente que tentou, todo o tempo, em toda a história tornada oficial perante séculos e séculos, impor sua cultura aos povos que chamavam de primitivos. Agora, estranho paradoxo, terminamos por destruir cada vez mais a Terra, enquanto alguns povos ainda se mantém em sua dimensão harmônica em relação ao planeta: ensinando ao branco como ser mais inteligente e educado em relação à Natureza, e a seu próximo...

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