Um homem saía pela porta da frente,
deixando as chaves outras sobre a pequena mesa da sala. Que fosse, pequena peça
do mobiliário, talvez houvessem outros suportes, um sofá, uma cama perto da
porta da frente, será que tipo de construção faria face a tudo o que se supõe
da arquitetura, do espaço, de um gesto de sair, mesmo quase compulsoriamente.
Saberia mais do que o possível se lhe tivessem dito, ao menos do se dizer com
franqueza, do que se passava então, pois do enviesado já estava farto. Quantas
construções sem sentido nas mentes de infelizes por não terem suporte cultural,
e como isso fazia bem ao poder. É mais fácil manipular a ignorância, e somente
os cultos sabem discernir quiçá até do ponto de vista histórico uma coisa da
outra. Não haveria senão poucos traços a traduzir seu caráter: um homem
simples, um homem da vida, amante da vida. Quantos amores se passaram até
conseguir ver que o nada parecia uma forma de amar na vida contemporânea, o
nada em si, o ser do nada, como diria um escritor... Até seus encontros seriam
dúbios, quiçá a gana de muitos o traírem, mas trair-se o que se na breve
possibilidade estaria apenas uma ideia, ou melhor, um estilo de se levar sua
senda! Creia-se que para esse homem a oferta carnal era apetecível, mas de
tantas e tantas formas que a ilusão se constituía em um hedonismo, daqueles por
companheiras construídas, das versões esquerdas ou direitas, do reto, do banal.
Usualmente saberia mais que era isso mesmo, e a crise se via crescer, a
desesperança era plantada em fragmentos de pequenos e intraduzíveis
ressentimentos, para não se falar nos ódios apenas aplacados por insumos
psicoativos, como álcool ou similares.
Nada... Que esse ser falasse, ao
menos por alguns minutos, mas se diria melhor dentro do alfarrábio de uma
poesia, ou em uma correnteza de expressão, que não precisasse ser do atavismo
cru, mas que descobrissem no oceano uma garrafa com uma carta sincera, jogada
cinco minutos antes do recolhimento.
Uma atriz era sua amante, não
propriamente fingidora do sentir, mas que sentia na sua arte o representar: de
palcos, de poética, de mimese. Carla o amava, seu nome estava escrito em seu
braço, a ver, cada qual em cada qual.
Chovia finalmente, e a chuva com
suas metáforas botavam o incandescente verão como um animal acuado perante as
pétreas gotas do sem perdão da Natureza. Que fosse o propósito desta, mas a
muitos o egoísmo previa tempo seco em suas piscinas e condomínios com placas
solares! A se gostar, que a roda girava, não sabemos os que leiamos algo se no
sentido da compreensão, se no intento intuitivo, ou nas verves raras de
talentos aplicados. Que fosse a noite uma longa chuva, que chegasse a ponto de
fazermos ver estrelas aparecendo por sob nuvens, por sobre o céu, e as nuvens
caindo na terra, a ver outras que apareciam mais teimosas, sem alguma
cadente...
Finalmente, que se dissesse, o homem
escrevia. Sentia uma saudade de Itália nunca visitada, a não ser por livros que
o fascinavam de per si, deste exemplo de uma língua maravilhosa, tão próxima do
Latim. Não negava ser católico, justo o oposto, via na comunhão a compostura do
rito sagrado, em que os ventos traziam da autoridade Papal. Como este, era
Francisco seu nome e, como o santo, adorava os animais, de tal modo que podia
viver tranquilamente sob a égide de um grande formigueiro, a considerar as que
estejam em filas, carregando fardos, ou curtindo caminhos... Seu nome estava
tatuado no braço esquerdo de Carla, e este no seu braço direito. Ambos – que este
pintava – amavam a arte mais do que o simples propósito material, e suas
expressões galgavam os muros em que os homens e as mulheres por vezes permitem
que construam em seu redor, talhando a si mesmos a escravidão do comportamento
que outros dizem ser normal. Algo sem sonhos, algo sem ideais, algo de ver o
mundo sob a esfera de contraordens apenas, em que a ternura cede seus espaços
para que resolvamos as coisas sem tangenciarmos no sentido de que tudo o que aprendemos
possa ser contestado em uma leitura com dinamismo e o encontro conosco que se
faça dia a dia...
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