Tolentino
sabia de muitas coisas, em se tratando de ofícios… Nem tudo bem
completo, mas um principiar, uma espécie de alquimia, de antigas
receitas, um pouco dos suportes da arte, e esta ele investigava, por
motor próprio, e da vida era, em todos os sentidos! Amava máquinas
igualmente, em suas épocas, tanto faz, no seu tempo: uma velha
televisão de tubo, ou um note de última geração. O amor que tinha
pela vida sempre foi intenso, pois via tudo como uma espécie de rica
ilusão, onde a arte poderia se tornar mais concreta, em
espelhamento, em interpretação, em contextos. As letras o
fascinavam, pois tanto teria a dizer que ninguém jamais ousaria
retirar-lhe o valor que aquelas representavam a ele. Então sempre
seriam de certo modo aquele rio que nunca cessa a correnteza, mas que
em remansos igualmente mantém-se cristalino. Era tudo isso citado
como se houvera se aberto nos sentidos, na mente, a caminho de
encontrar-se com um mundo mais inteligente, como quando se cata o
abacate…
Era
a Verdade uma disciplina que diziam alguns cursar. A ele, bastava uma
formiga caminhando, que a questão era a formiga em várias direções,
outras trabalhando, no entremeio a fugidia sombra de uma árvore, em
outro aspecto uma imagem de um homem gigantescamente poderoso
falando, mas que cessava quando saía da imagem e via de novo um
inseto, para ele mais real, para ele mais importante, posto no mundo,
posto no movimento. Então do material, então do espírito, mas
todos os corpos, as teles, os troncos, e muito da ciência tinha a
ver com a seiva que corre por dentro das amendoeiras, ou nos fluxos
fibrosos de uma palmeira. De se pegar um ramo, um ramo livre de se
pegar, e ver se tem flexibilidade suficiente, e encontrar no nylon
uma similaridade, do objeto, já se avizinhava um processo de estudos
extenuantes, na descoberta dialética e crescente da vida, na
compreensão do mundo. Sabia disso, os ofícios lhe valeriam, sabia
professar o conhecimento, amava loucamente conhecer, adquirir a
ciência e aprender com a Natureza. As gentes eram como eram… Por
vezes acentuava-se um painel que ele não descobria a seu termo,
alguns ícones, alguns botões que não houvera de sabê-los, mas que
eram, e bastava, para o posteriori.
Não
dava muita importância a que muitos lhe creditassem o que cria
existir em sua consciência, mas partilhar seria sempre bom, ao menos
para ensinar a quem quisesse aprender que o Poder era uma face da
transformação, um significado de ação que por vezes não lhe
caberia ressaltar muito, pois a lógica natural é sempre infinita e
transcende Peirce, transcende o que creem ser o que há além dela,
mas apenas em substratos de pensamentos, posto a percepção humana
ser limitada, e a Verdade passa a ser a eterna dúvida, o eterno
encontro, o que não retorna como certeza, o improvável, o
balanceamento de questões íntimas do ser, a Humildade referente e
necessária diante do sagrado e imutável em essência como
particular, na premissa da qualidade, anulando o pensamento de
matrizes, ou de número. Técnica. Prática. Um modo além do método,
esse arcabouço filosófico seria de máxima abertura do pensamento,
a ver que nas relações produtivas o espelhamento com um certo
misticismo é necessário na concepção investigativa de Tolentino.
Pois não seria possível alguém se abrir nos mistérios para
açambarcar o propósito de muito seres que pautam pela busca, pela
procura, no modo inenarrável e poético do voo de um pássaro
pescador, ou na mesma realidade do peixe que há sob a superfície. E
buscar funcionamentos é técnica. E o manejo é prática, mesmo
quando empunhamos um balde sobre uma plantação inteira em nosso
próprio húmus.
Tolentino
era um pouco de tudo. Talvez fosse alguém mais conhecedor de certos
ofícios, como citado, mas na rocha residia seu primeiro encanto. Na
água encontrava outro, na terra mais um e no éter do céu a
profusão de outros significados. Sentia a totalidade de suas
superfícies, no tato de seu olhar, na sua visão de seco ou molhado,
em saber que na verdade o encanto era algo que lhe prosseguia como o
vento nas velas enfunadas, e sabia disso, sabia que seu corpo
navegava, sabia quiçá que estava meio como um capitão com muitos
barcos e um grande navio, que era sua existência mais agregada, com
tripulação de fé, e buscava… Investigava cores, tipos de
refrigerantes, panelas ariadas, máquinas de lavar, panos de enxaguar
pisos: os ofícios de um barco. O telefone, os canais de comunicação,
que tudo se resumisse no enxuto, no mais provável, na simplificação
de diversos setores que se somavam a outros e outros em outros
detalhes, em futuras compreensões, que não temia aprender, isso
não, não nem que quisessem admitir outros.
A
arte era um grande canal, de se soltar os freios, mas vinha lotada
com a ciência, já que hoje salva a ciência de nos compreendermos,
de podermos ser inteligentes sem inibição, de investigarmos quantos
goles possui uma terça parte de um copo de água, ou como bebermos
inquietos aquela água que fica disposta ao calor do sol, na
observação rutilante de que esse líquido falta – e muito – no
mesmo planeta em que dizemos que sabemos em menos de um segundo o que
se passa no Japão. Tolentino pensava, em sua perscrutação, que
seria bom dedicarmo-nos para saber exatamente onde falta essa água
para que saibamos que no conforto de termos apenas se ampliarmos para
que todos a tenham não faltará para quem acredita que sempre terá.
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