quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

ROTEIRO PARA UMA GOTA DE REALIDADE

 


            Começa com um personagem despertando de um sono conturbado em pequeno pesadelo no principiar da aurora… Ele acorda, seu braço está sem resposta, pois mais uma vez, em virtude de um sonífero forte, dormiu em cima do membro. Não há para quem ligar, e seu celular recebe estranhas mensagens, apesar de não ser muito sofisticado, talvez em virtude desse mesmo fato. A volta com o carro lhe facilita, mas o usa apenas em serviço, a não ser para degustar um café nas entrelinhas dos esforços e, particularmente naquele sábado não havia muito do que cria encontrar… Talvez algum conforto lhe desse esperanças, mas para ele não haveria a menor possibilidade disso se não pudesse compartir. Escrever seria apenas para enviar cartas imaginárias, mas neste dia gostaria de algo parecido com um retrato do que talvez tivesse acontecido na noite em que dormira, naquele bairro continental, pois dizia-se que verdadeiras guerras eram travadas à noite, especialmente no Sul, onde o preconceito sempre fora maior, e que este gera sempre conflitos. Justamente, pois quando um cidadão mais pobre tem suas posturas de contestação de um mar de desigualdades, este enfrenta acirrados rivais…
          O roteiro se perde um pouco, pois a complexidade em gerar um filme não acontecerá assim, posto este trabalho possuir a pretensão de apenas ser projetado enquanto leitura na criatividade de quem o lê. Pois bem, digamos que o nosso personagem se chame Robertson. Vai à cozinha, como qualquer outra, mais antiga no entanto, de casa de mais de meio século, com azulejos dispostos depois de reparos na parede, com várias cores, do branco ao terra… Um estranho bairro de uma ilha que dava suas costas de chumbo na linguagem de muitos domiciliados, por vezes vindos de outras partes, muitos estrangeiros, igualmente, com missões secretas ou totalmente abertas quando tinham a ilusão de que o controle já haveria tomado conta. Não esqueçam, isso fala o roteiro, pespontado com uma gota de realidade na sua forma, em que seja de romantismo na maior parte, mas que este modesto autor não sabe dizer sem o surrealismo que se torna presente para retratar um mundo ou situações que tangenciam o absurdo… Robertson vira um filme que dizia sobre a libertação sexual, e como as novas gerações raspam pelos, e se quedava sorumbático, pois achava um absurdo alguns terem barba e nada na genitália, mas não tinha a pretensão de pormenores, pois talvez fosse sutileza, sinal dos tempos mais modernos, em que sua companheira ainda era bem peluda, como ele, e não seria tudo mais como apenas mais uma comédia de costumes. Justo que amasse achar fontes escondidas dentro de matagais, literalmente, em metáforas tão belas como a Natureza de seus amores. Ordenou a cozinha, lavou os pratos de ontem, tirou a carne de sol da água, tomou um leite, um pouco de pão ázimo com uma boa pasta de grão de bico e gergelim, com o alho que costumava comer todos os dias daquele maio um pouco conturbado, como tivera sido desde o verão. Não se consideravam dados os entretenimentos, pois Robertson… A ele, pouco importava aquelas pessoas que levam toda uma existência em observar a vida alheia, querer saber do que se passa com tudo e todos, achando que prestam um grande serviço à humanidade, mas a Robertson isso não passava de práticas antigas que o mundo carregaria consigo, em meio agora de tantos mecanismos em que muitos se tornam dependentes da eletrônica, talvez o pior vício da era moderna, pois o que se vê em certos displays, muitas vezes, é uma grande e assustadora alienação mental, posto nada a ver com a realidade mais objetiva. Robertson achava tanta graça nisso tudo que via em suas alucinações reais que os novos diabinhos já viriam com rabos de cabos USBs, bastando o plugue!
         Já vimos que este pequeno filme não roda em sequência, e temos apenas um personagem. Imaginem que quem escreve seja o outro personagem, pois a forma não importa mais tanto como o conteúdo, e se isentamos a forma de sua função, teremos a concepção da obra em aberto, em que há, em meio a isso tudo, um que escreve e projeta, e outro que lê e, tomara Deus, conteste… Mesmo porque quem não se remeter a um diálogo justo, mais aberto, vai acabar não se expressando mais para despejar nas redes sociais um ego que se torna código binário mais precioso ao sistema de informações do que sonha a já tão rara em sincero filosofia, pois nem tudo está escrito.

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