domingo, 22 de dezembro de 2024

QUANDO A FALA VEM COM O SILÊNCIO


                Estar-se praticando a análise é tarefa árdua por vezes para o analista quando o paciente já demonstra a contrariedade em falar, mantendo-se em silêncio, posto o analista não pára de pensar a respeito, e sua atitude nem sempre vai ser a mais apropriada... Deve-se respeitar o silêncio do paciente, o analista deve resistir a esse tipo de ocorrência na psicanálise, mas muitas vezes falar algo denota que a quebra do silêncio pode acarretar uma sessão mais produtiva, pois a inibição por vezes dá o empuxo necessário a que o paciente associe mais livremente as suas ideias frente ao terapeuta.

                Por vezes o silêncio é uma pausa depois de um processo onde houve um esvaziamento do inconsciente do paciente, como se descansasse, ou desse um tempo para recarregar as baterias, ou mesmo depois de um momento onde teve um insight oportuno, um encontro com sua realidade mais pungente, algo que temia falar e que brotou naturalmente, aliviando-o de uma pressão existencial profunda. Faz parte o ofício do terapeuta também se utilizar do silêncio por vezes, dar um tempo ao tempo, falar pausadamente, redarguir, questionar e interpretar uma palavra de importância na acentuação da fala do paciente, quando se fizer necessário, ou quando sua intuição achar importante esse questionamento. Estar com o inconsciente sintonizado com o inconsciente do paciente é tarefa importante do analista, pois isso lhe dá a abertura necessária para que mergulhe fundo nas questões faladas, nos silêncios, nas pontuações, e nas palavras ditas no caso de se estar escutando na modalidade da atenção flutuante, que é quando o paciente, já bem desinibido, fala livremente as suas associações, sem necessariamente ter um sentido muito lato em suas ideias ou vivências...

                O analista tem que possuir resiliência e persistir em valorar seus próprios pensamentos a respeito de situações onde o silêncio do paciente possa estar relacionado com outras questões, mesmo quando profere uma única palavra, que pode ser a chave para aquele desvende momentos onde se quebre o mesmo silêncio e a sessão transcorra com naturalidade e proficiência. Por vezes algo como: você não se sente à vontade de falar como foi o seu dia hoje? Ou perguntas relativas ao andamento de outras questões as mais várias, podem romper a inibição e iniciar um processo de fala mais amplo, mas sempre há que se deixar o paciente falar livremente, e estar atento para poder interpretar o que estiver por trás do discurso, muitas vezes.

                Na escuta objetiva, muitas vezes o paciente migra para a fantasia, e o analista o trás para a realidade, tentando situá-lo na mesma, para que o princípio de realidade prevaleça no discurso, onde o inconsciente torna-se a fonte para que a interpretação do analista traga esse material ao nível do consciente. Por isso, é recorrente o fato de que o paciente ofereça resistência de várias formas no processo terapêutico, tentando evitar falar sobre determinadas questões ou mesmo pulando de um a outro assunto, como quem trilha um silêncio sobre camadas, onde o terapeuta tem que desencavar verdadeiras equações para encontrar os elos de ligação, onde está a fantasia, onde estaria a racionalização do paciente, que também é uma forma de resistência, pois busca explicar uma fala onde houve um arrependimento qualquer.

                Há diversas quebras na questão da análise de um paciente, que por vezes tem causa na inibição e em outras na resistência, na transferência negativa, na agressividade e outras. A relação entre o par analítico sempre deve ser de confiança mútua, e por vezes o tempo é que consolida essa dita relação, mesmo porque será na citada confiança e melhoria paulatina do paciente, com seus insights a respeito de si mesmo, e as questões da competência e humanismo do terapeuta que a coisa se processa da melhor forma possível. A interpretação correta da situação do paciente, suas inquietações e o que acontece no seu imo mais profundo, pode efetivamente permitir a remoção de traumas, ou mesmo a catarse em lembra-los, bem como livrá-lo de estar com relações de dependência de várias naturezas, melhorar a relação com seu entorno e estar mais em harmonia no trabalho, na escola, ou em grupos, na sociedade como um todo.

                O perfil do silêncio por vezes não é o que aparece, não é o que aparenta... Há pessoas internamente convulsas que gritam em seu silêncio, e cabe ao analista descobrir as angústias que decorrem dos tempo atuais, tão afeitos a processos existenciais complexos, tantas são as solidões mundo afora, tantos os desacertos, os desafetos, problemas econômicos e outros. A seara para se estar em consonância para um processo paulatino de recuperação psíquica de muita gente dependerá da boa vontade do par analítico como unidade, e a confiança do paciente no terapeuta denota que este esteja cumprindo bem o seu papel, não faltando nas terapias e concedendo a atenção e compreensão necessária àquele que necessita de cuidados. Por isso, apesar do silêncio por vezes inevitável, a palavra sempre será essencialmente fundamental.

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