O caso
de P., 12 anos, perde a mãe de um infarto fulminante. Uma criança que a
terapeuta trata e nas terapias tem sido assíduo e pontual... Um menino ativo,
até demais, seriam os momentos em que pudesse ser mais infantil aqueles que
sequer se permite. Bom aluno, visto com certa prepotência, mas sofre de anurese,
depois de ter ocorrido o falecimento da mãe. As ferramentas no trato
psicanalítico com crianças passa pelo brincar, são outras, deve-se entrar em
seu imaginário, e no caso desse guri, quiçá quando pensara que deveria estar
presente junto com a mãe para que nada tivesse acontecido, posto estava com a
irmã, sendo ele um temporão, a irmã, já casada, e uma espécie de mãe tamponada.
Na figura da analista, igualmente, uma outra figura, parecendo todas, incluindo
a tutora da escola que lhe dá as aulas de reforço, igualmente figuras que
preenchem essa necessidade da mãe, essa questão da falta, que o menino nega em
sua fala, dando uma de durango kid, de super herói, dentro obviamente de seu
imaginário algo desconstruído, meio frágil, mesmo sendo experto no jogo, sendo
um bom filho de seu pai e bom e devotado aluno, praticante de karate, etc.
Huizinga
já falava, em seu “Homo Ludens” o aspecto de jogo na civilização e nas
culturas, desde as mais primitivas às mais desenvolvidas, desde os diversos
ramos de atividade, como o esporte, o jogo em geral, os games se desenvolvem, e
como milhões de pessoas jovens, adultos e crianças fazem uso desse manancial de
entretenimento. Na psicanálise especialmente, para entrarmos no universo
infantil, o jogo é algo soberbo, pois o campo simbólico do discurso se dá na Natureza
desses pequenos seres de forma mais simbólica do que imaginamos... É através do
jogo das cartas e de não saber perder, que P. manifesta sua forma de ser mais
responsivo, maior, mais importante, zeloso e quiçá até um pouco prepotente,
ocultando uma agressividade que pode estar latente, e seria com esse recurso
extraordinário que o analista deveria se colocar frente ao desafio de extrair o
sentimento de culpa e de castração que o menino esboça frente à fantasia de que
se estivesse junto à sua mãe evitaria o pior, apesar de ter sido um infarto
fulminante, e fatalmente nada poderia ser feito. Mas deve ser um trabalho
escalonado, por etapas, na medida em que se desconstrói a estrutura imaginária
desse analisando, possibilitando não relacionar diretamente esse mesmo aparato simbólico
com seu problema de anurese, derruindo o processo e desmistificando o saber
mesmo da fantasia criada, repondo ou diluindo em outros paradigmas psíquicos. O
uso de bonecos, uma representação teatral que revele a frustração, ou
propriamente um super-herói que frustrasse a expectativa de nada fazer, seria
uma boa medida para entrar no imaginário do menino, ou o jogo em si, observar
como ele reagiria à possibilidade de derrotas, ou mesmo revelar a essa pequena
persona em construção que errar é humano, e que somos sujeitos a falhas, mas na
realidade há erros em que efetivamente não somos responsáveis por eles. E que
essa culpa não deve ter razão, mesmo que saibamos que a razão é um terreno
relativo, principalmente quando tratamos de um terreno como o inconsciente, e
como as coisas se precipitam em sentimentos, recalques, e castrações dessa
ordem.
Em
síntese, na análise dos adultos utilizamos o campo do simbólico, do imaginário
e o real, na visão lacaniana, assim como no ego, no superego e no id, na
questão freudiana, e na questão infantil não é distinta, apenas as ferramentas
de se alcançar o domínio expressivo do analisando é distinto, mesmo sabendo que
por vezes quando cremos que o jogo é excelente para uma abordagem infantil,
quiçá muitos adultos joguem o tempo todo igualmente, mas isso se dá no plano
das ideias, da associação livre, e quiçá de uma razão e soberbas que distinga o
ser do próprio ser, fenomenologicamente falando, na pura questão existencial de
afirmações ou, quando tecnicamente a busca pela terapia é sincera, na exposição
evidenciada de nossos mais íntimos sofreres...
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