quarta-feira, 2 de abril de 2025

A DIALÉTICA DO ENTRE ANÁLISES


                Mulher, J., 34 anos, paciente psiquiátrica de depressão, tomando medicamentos.

                É singular vermos que na síntese final, depois de discorrer tantas coisas relacionadas à sua negação enquanto mãe, a vontade de apenas dormir, comer, depois dormir, e nada mais, quando nega que nem os filhos mais gostaria de ver e que sua mãe é melhor mãe deles, e negar sua vida, que nada dá certo, o analista lhe pergunta: “... você lembra como foi quando seus filhos começaram a andar?” Ela responde: “Nossa, eles caíam direto. Andavam ‘tudo torto’, sem ritmo e sem jeito...” Ou seja, poderiam ser várias respostas, como: eles eram uma gracinha, eu achava esse desenvolvimento da infância muito rico para mim e etc. Mas o analista, opondo-se dialeticamente ao discurso da paciente, lhe diz: “E você estava ao lado deles?” E ela: “Sim sim... sempre...”

                Fechando magistralmente uma análise como poucas, deixa nas entrelinhas e encerra nesse exato momento, se despedindo da paciente, deixando em aberto o encontro que ela deixara escapar consigo mesma, de que houvera ser mãe o tempo todo, e tudo que ela demonstrara de angústia frente ao marido, frente a presença de um Grande Outro que a tudo a observaria, de estar sufocada por circunstâncias existenciais profundas, verte na sessão, exatamente naquela última assertiva em que geralmente Lacan, com sua experiência encerrasse sempre a sessão, pois já acharia ser o suficiente. A psicanálise não é um processo que acontece apenas durante a sessão, pois é exatamente em seus intervalos que a dinâmica não cessa, e a dialética da existência vai se contrapor à experiência única de uma outra sessão onde porventura as questões mais profundas virão mais classicamente à tona, quando um insight vira revelação na fala do paciente, de si para si mesmo...

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