Saberíamos
melhor talvez a natureza de como pensar algo distante da realidade que nos
tolhe se pudéssemos falar, como Freud aborda, da necessidade de se falar ao
outro, ao ser que pensa, mas creio que a forma do si mesmo, de se estar
presencialmente falando, do contato entre um ser e o outro é melhor do que
procede nos tempos atuais, onde é recorrente o ser humano ter um contato maior
com a realidade digital e projetar, ou praticamente sonhar delirantemente com imagens,
sons, expectativas afetivas através dos displays que os meios conferem a tais
possibilidades: por vezes um simples abraço afetuoso é mais raro do que aquele
que denoda um contrato, ou um laço familiar quase estanque de afeto sincero...
Quando
na infância as crianças se reuniam frente aos quintais mais amplos de suas
casas, quando a vida não era compulsoriamente dentro de edifícios e a rua não
era um ambiente “hostil”, principalmente nas grandes metrópoles, as relações
oníricas eram quase uma questão vivenciada em lócus por infâncias saudáveis, e
as relações com os livros não eram pontualmente didáticas ou obrigatórias, mas
questões onde se lia mais do que o que fazem com aparelhos de vídeo games hoje,
com os computadores, ou mesmo usando-os sem um despertar de que esses mesmos
meios podem se tornar um bom instrumento para que se desenvolvam, e não o mero
resultado de que vão sonhar com um ser amado, já hoje mais crescidos, por através
de contatos de redes sociais, ou mesmo sites de encontros, onde o que se depara
no final com aquele que estava do outro lado antes, com o devido perfil, ou
espécie de “self digital” não corresponde ao que se projetara sendo aquilo com
o que sonhara.
Até que
ponto o mundo digitalizado que, na medida em que causa uma certa paranoia sistêmica
com relação a uma sociedade aparentemente controladora e, por outro lado, amplia
o leque de conhecimentos, não apenas acadêmicos, com os cursos remotos, ou
EADs, mas igualmente no campo das artes e da pesquisa, onde a tecnologia,
quando bem empregada sói reconstruir as estruturas... Mas, voltando, até que
ponto esses fatos vão influir nos sonhos reais, no que se deposita no
inconsciente, na percepção equivocada, nas enfermidades mentais, quando se faz
uso de drogas ou álcool para que se aumente a performance nos trabalhos de homework ou mesmo nas empresas onde se
contrata gente profissional com tarimba em sistemas, ou mesmo artistas
gráficos, gerentes, etc, ou seja, como a vida das gentes em geral e sua psique
lida com um mundo onde essas novas interfaces – agora inevitáveis – vão construir
um ego que lide com a situação dos instintos, ou tudo o que signifique utilizar
os meios digitais para que se construam possibilidades onde a própria
sexualidade seja algo que não passe necessariamente pelo uso dos seres humanos
como objetos, como meros instrumentos do prazer, como na sociedade de consumo
facilitadora para quem possui boa posição social, ou mesmo as condições
necessárias para se adquirir bons equipamentos e galgar degraus concretos rumo
a uma vida afeita a realidades sexo-afetivas saudáveis...
Quiçá
possamos crer que o grande iceberg do inconsciente estará emergindo através das
máquinas digitais, ou que os encantamentos de tipos de serviço quais gôndolas
onde consumimos o prazer não estabelecerá um tipo de ameaça onde uma sociedade
mundial realmente mais controladora subverta a normalidade psíquica mais
autêntica no modal em que os instintos reprimidos acabem sendo solapados pelo
consumo e a citada objetificação do ser? Talvez a resposta mais certa sobre as
dúvidas seja no campo mesmo das dinâmicas do perscrutar-se o indivíduo, os
grupos, a psicanálise enquanto ciência, a religião como religação do ser com o cosmos, a noção de que não
estaríamos sozinhos no universo, como a questão de Copérnico quando de sua
assertiva, sobre não sermos o único planeta, a compreensão de que o criacionismo
revisita seus conceitos a partir de Darwin, e que isso não faça de uma
regressão a necessidade de um futuro mais obscurantista, quando os seres não
abram espaço quase de um sonho remoto em que os deuses de outrora não sejam
aqueles mitos, ou que fossem a linguagem de Lacan, ou os símbolos de Jung... No
propósito de se ter um ser consciente não obste a fração de importância cabal
de que a mesma consciência tende a ser a capacidade crítica do mesmo ser, e que
as diferentes manifestações da Natureza e seus diálogos venham a engrandecer a
percepção do homem enquanto criatura e criador, homo erectus e sapiens, meio
orangotango, meio selvagem, mas com um ego controlador e contemporizador, meio
mais sólido que permeia os instintos da mesma selva urbana em que por vezes se
encontra com seu id e peculiar profundeza, e a semântica muito necessária no
viés contemporâneo de um superego mais altruísta e reformista do caráter da
personalidade humana.
Em
síntese, por vezes não sonho mais, ou nunca mais teria me lembrado do último
sonho e, quando acordo, vejo que parto a uma realidade quase onírica, onde o
viés de uma poesia me remete, sem uma única substância a não ser a tela
maravilhosa de um computador, a um universo pleno onde me encontro com uma
força grandiosa que me move, e que quiçá fora apenas um gesto da arte, ou mesmo
uma pequena imagem do que penso ser Deus.
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